sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

Despedida

- Vou para Budapeste.

Disse enquanto estávamos nus, deitados de barriga para cima numa cama bagunçada sob uma lâmpada amarela, quase falhando. Ela virou seu corpo em direção a mim, sua mão tocou os meus cabelos e falou, com tristeza na voz.

- Me escreve?

Senti uma pontada de pena, outra de afetação moral. Entrei na vida dela sem perguntar se podia, mudei todos os seus parâmetros morais e invadi o seu corpo até que eu simplesmente enjoasse e decidisse ir embora. Senti-me um canalha. Ela sabia disso, eu havia avisado-a sobre as minhas tempestades, as minhas mudanças repentinas, a minha instabilidade. Não, eu não iria escrever. Menti:

- Sim, pode deixar, vou mandar notícias.

Ela abraçou meu corpo, olhou-me fundo com seu par de olhos castanhos, levemente puxados como os olhos árabes. A qualquer momento ela choraria. Beijou-me. Enroscou sua perna branca na minha morena. Pude sentir seu pequeno coração bater bem rápido com um quê de tristeza que me emocionava. Se ela chorasse, era capaz de eu chorar com ela. Odeio despedidas. Eu precisava ir.

O impulso surgiu em um dia de verão intenso, na beira da praia. Buda Peste. Duas cidades divididas por um grande rio. Uma das mais belas capitais européias, com um povo de etnia magyar, uma língua estranha e mulheres maravilhosas. Comprei livros, li sites, blogs, conversei com pessoas que moravam lá, decorei nomes de ruas, boates, museus, tudo. Budapeste virou uma obsessão para mim. Falava dela para os amigos, as amantes tinham ciúmes dela, a minha vida passou a se resumir a ela. Budapeste, eu amava-a sem conhecê-la.

Ela não tentou enfrentar essa obsessão. Foi minha aliada e procurou hotéis e lugares interessantes para mim. Ela parecia entender essa minha necessidade, esse meu impulso, esse meu gênio e aceitava, como um cordeiro aceita seu destino sem protestar. Não teimou, não derramou sequer uma lágrima na minha frente. Encarou a minha viagem, como fruto de um destino inadiável, irreparável, uma dor que ela deveria sentir. 

Na noite em que me despedi, pediu-me apenas para ter cuidado, com aquela voz de mulher protetora. Disse-me que iria me esperar, que iria amar-me mesmo longe e que quando eu voltasse, estaria esperando por mim.

- Não espere por mim, não é justo. Disse, tentando soar seguro.

Teimosa, respondeu que me amava, que eu era tudo para ela. Falou que não adiantaria meus pedidos. Iria me esperar. Era seu corpo, seu coração que ordenavam, não sua razão. Ela iria seguir isso cegamente, da mesma forma que corri atrás do meu impulso europeu. Olhei-a com carinho, beijei levemente os seus lábios, guardei a mala no táxi, dei-lhe o último abraço. Entrei no carro e saí em busca da minha Budapeste. Não, eu não a amava.